domingo, 21 de novembro de 2010

A Natureza Como Limite da Economia

José Eduardo Mendonça
“Aristóteles fala em quatro tipos de causas. Todas elas explicam o que é uma coisa, para quê serve, como foi feita e porque foi feita. Acredito que os gregos nos deram esta visão de mundo e que hoje não podemos fazer uma única pergunta que já não tenha sido perguntada e respondida por Aristóteles e Platão.”

Assim disse, certa vez, em entrevista, o matemático, economista romeno Nicholas Georgescu-Roegen (1906-1994), dando uma mostra da origem da perquirição e da e humanidade que permeiam sua importante contribuição ao debate econômico atual. Ele foi deletado dos manuais de economia e da discussão acadêmica, em 1967, por seu colega americano Paul Samuelson, que um ano antes elogiara seu trabalho.

O motivo? Georgescu, um pensador extremamente original, e hoje reabilitado como fundador da economia ecológica, ousou destoar de seus colegas de ofício, mergulhados, então (como ainda o estão hoje), em uma visão de mundo determinada pela construção de um arcabouço teórico baseado na mecânica. Esta visão do sistema econômico fala da relação entre a produção e o consumo e pretende mostrar como circulam produtos, insumos e dinheiro entre empresas e família. É um sistema fechado e circular. “Fechado, pois não entra nada de novo e também não sai nada. E circular, pois pretende mostrar como circulam o dinheiro e os bens na economia. Serve, portanto, para a perpetuação de uma visão particular do processo econômico”, argumenta Andrei Cechin em seu brilhante trabalho.

Cechin, mestre em ciência ambiental pela USP e economista formado pela FEA-USP, retoma o pensamento de Georgescu, que enxergou, há seis décadas, a possibilidade de que economias nacionais pudessem ter de encolher, e não continuarem a se orientar por um crescimento contínuo, o que não seria sustentável. E isto vai frontalmente contra o paradigma reinante na economia, que “teve como importante sintoma o não reconhecimento dos fluxos de matéria e energia que entram e saem do processo econômico e muito menos o reconhecimento da diferença entre o que entra e o que sai deste processo”, lembra ele. Cechin observa que “a economia não é uma totalidade, mas, sim, um subsistema de um sistema maior, geralmente chamado de meio ambiente... Os economistas, ao focarem o fluxo circular monetário, ignoram o fluxo metabólico real. Ao contrário dos economistas, os biólogos jamais imaginaram um ser vivo como um sistema total, ou como uma máquina de moto-perpétuo”.

O autor é erudito e claro em suas formulações, e o livro merece e requer uma leitura muito atenta. Como seu orientador, o economista José Eli da Veiga, autor do importante
Mundo em Transe e de A Emergência Socioambiental, Cechin percebe que a utilização da metáfora mecânica como base para a economia clássica fez com que ela fosse tratada “como um sistema isolado, autocontido e a-histórico, não induzindo mudança qualitativa, nem sofrendo efeitos das mudanças qualitativas no ambiente”. O novo paradigma proposto por Georgescu e seguidores é examinado meio de esguelha e desconfiadamente pela maior parte dos economistas justamente porque pode desmascarar uma ilusão que conduziu séculos de desenvolvimento, mas que hoje de nada mais serve a não ser para interesses que dela se alimentam em prejuízo da humanidade.

Um importante discípulo de Georgescu, Herman Daly, é citado por Cechin ao sumarizar os ajustes necessários na política econômica para que a economia funcione de forma sustentável ambientalmente: 1. Transição demográfica dos bens, ou seja, taxas de produção iguais às taxas de depreciação, em níveis baixos. Isso significa estender a vida útil dos produtos. 2. Melhoras qualitativas e aumentos de eficiência, sem elevar a quantidade de materiais processados. 3. Banir o comércio livre enquanto coexistirem países que tentam internalizar os custos ambientais nas decisões econômicas e países que praticam preços inferiores por não pagarem os custos ambientais. 4. Mudar o alvo dos impostos de renda auferida por trabalhadores e empresas para o fluxo produtivo, de preferência no ponto em que os recursos são apropriados da biosfera.

Tarefas magníficas, considerados o empenho e o poder da resistência a elas. E, também, considerada uma necessária mudança de paradigma, que envolve uma reeducação em questões não compreendidas pela maior parte das pessoas, e o ajustamento do fosso epistemológico entre o que a economia clássica quer que acreditemos seja o real e o que o real significa de verdade. A leitura de trabalhos como o de Cechin deve ser incentivada e disseminada. Estimula, instiga e provoca, ajudando-nos a desmantelar mitos desnecessários e daninhos.
A Natureza Como Limite da Economia
A Natureza Como Limite da Economia – A Constribuição de Nicholas Georgescu-Roegen
André Cechin
Editora Senac São Paulo - 264 pp

Um comentário:

  1. "Este livro é de grande importância, pois fala da relação sustentabilidade-economia, mostrando seus paradigmas como, por exemplo, o do desenvolvimento sustentável e o de como usar desde artifício na dominação da economia."

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